Rebeca Andrade: “Tudo que é mais difícil tem um gosto melhor”

A ginasta Rebeca Andrade, 22 anos, que ganhou medalha de ouro no salto e prata na competição individual nos Jogos Olímpicos de Tóquio, contou detalhes de sua preparação antes das competições, de sua amizade com Flãvia Saraiva; sobre a polêmica de as alemãs terem usado macacões para a apresentação e muito mais. Tudo isso em uma coletiva de imprensa com vários jornalistas brasileiros online, em que demonstrou a mesma determinação que mostra nas apresentações.

Rebeca Andrade (Foto: Júlio César Guimarães/COB)
Rebeca Andrade (Foto: Júlio César Guimarães/COB)

“Eu e a equipe toda demos 110% de nós. Erros acontecem, faz parte do esporte, faz parte da vida, e aprendemos a crescer com eles. Todo mundo erra e está tudo bem. Ninguém vence todos os dias, quando vence, tem que aproveitar e curtir”, afirmou durante a entrevista, da qual o “Elas no Tapete Vermelho” participou.

Rebeca Andrade ( Foto: Míriam Jeske/COB/Divulgação)
Rebeca Andrade ( Foto: Míriam Jeske/COB/Divulgação)

A atleta espera que haja mais incentivos aos esportes em geral e mandou uma mensagem para as crianças negras, como ela e Daiane dos Santos, ex-ginasta que foi campeã mundial. “Elas precisam acreditar que é difícil mesmo. As oportunidades não são as mesmas, mas as conquistas vão ser melhores, porque tudo que é mais difícil tem um gosto muito melhor.”

Confira trechos da entrevista abaixo.

Preparação pouco antes da competição

“Sou eu mesma que me arrumo antes das apresentações. Quando era criança, minha treinadora fazia meu cabelo e me maquiava, mas aprendi e faço há anos. Sou eu que faço tudo, me maquio, prendo meu cabelo. Começo duas horas antes. Nesse tempo, aproveito para escutar música, conversar com as pessoas, fazer minhas orações e meus agradecimentos. Vou curtindo o momento antes de sair.”

Rebeca Andrade (Foto: Wander Roberto/COB/Divulgação)
Rebeca Andrade (Foto: Wander Roberto/COB/Divulgação)

Collants x macacões

Os collants que usamos são sempre uma surpresa. Não dou palpite, mas amo todos. Os nossos são sempre maravilhosos. Sobre os macacões das alemãs, acho que foi uma conquista muito grande para as mulheres. O mundo vai poder ouvir e respeitar a gente, porque a prática do esporte tem que ser confortável. Eu me sinto muito bem usando meu collant com manga comprida e a parte de baixo mais cavada e curta. Se elas não se sentem bem, é preciso achar uma forma para que todas se sintam bem, representadas e confortáveis. E elas estavam maravilhosas. Sei que a ideia foi delas, mas eu me senti muito representada com essa atitude delas. Um orgulho de ser mulher.”

Amizade com Flavinha e tatuagem

“A Flavinha (que competiu na trave após lesão, ficando em sétimo lugar) é uma pessoa, pessoal incrivel, uma das melhores amiga. Ela é muito empenhada e dedicada, mas infelizmente teve aquele probleminha no pé. Isso é esporte de alto rendimento e essas coisas acontecem. Eu falei para ela, assim que aconteceu o problema,  que isso é ginástica e esse tipo de coisa acontece. Se eu passei por tudo que eu passei e estou aqui, então também vai passar para ela. Disse para ser forte e que confiava nela e em em seu trabalho. Temos uma tatuagem que mostra essa amizade. A minha está escrito “I’m” e a dela “With You”, que significa, em português. “Eu estou com você”.

Rebeca Andrade (Foto: Júlio César Guimarães/COB)
Rebeca Andrade abraça Flávia Saraiva durante a competição (Foto: Júlio César Guimarães/COB)

Investimento nos esportes

“Fiquei muito feliz por ter representado o Brasil e com todas as mensagens que recebi, de pessoas famosas ou não. Espero que a gente tenha mais investimento e que as pessoas acreditem mais em todos os esportes, não só na ginástica. O esporte salva vidas, educa, te amadurece e ensina que a vida não é fácil. Faz você se tornar uma pessoa melhor. Eu já teria uma base dessa dentro de casa, pela mãe e pela família que eu tenho, mas o esporte só reforçou isso, e hoje todo mundo pode ver. Falo isso de coração.”]

O esporte salva vidas, educa, te amadurece e ensina que a vida não é fácil

Erros acontecem

“A gente trabalhou muito duro para fazer o melhor que podia. Eu dei 110% de mim, a Flavia também, o meninos também. A gente está sempre pronta para fazer o melhor. Erros acontecem, faz parte do esporte, faz parte da vida, e a gente aprende a crescer com eles. Todo mundo erra e está tudo bem também. Ninguém vence todos os dias, quando vence, tem que aproveitar e curtir. É muito trabalho por trás disso e estou muito feliz pelo que a gente conquistou nessa Olimpíada.”

Tranquilidade

“É uma coisa minha mesmo ganhar o ouro ou ficar em quinto lugar e ter essa tranquilidade. Sempre esteve aqui dentro, mas precisava ser trabalhado. Para se ter uma ideia, nos dias da apresentação, eu nunca estive nervosa, nem ansiosa.”

Simone Biles

Na ginástica, tudo pode acontecer, você não sabe o que vai passar até você fazer.Para ser sincera, eu fiquei triste quando a Simone Biles saiu. Não é uma torção, uma dor nas costas, foi psicológico e não se brinca com a saúde. Fiquei triste, mas depois feliz, porque pensei nela em primeiro lugar. Sempre admirei o psicológico dela, que carregava nas costas os Estados Unidos e até hoje não sabemos até onde ainda pode chegar. E ela ter se respeitado e muito importante para todos nós.”

Rebeca e o técnico Chico (Foto: Míriam Jeske/COB/Divulgação)
Rebeca e o técnico Chico (Foto: Míriam Jeske/COB/Divulgação)

Vontade de desistir

“Quando passei pelas cirurgias (ela se submeteu a três cirurgias nos joelhos), pensei em desistir sim, mas muita gente me ajudou principalmente no psicológico, antes mesmo do físico. Nas duas ultimas vezes, em 2017 e 2019, eu olhei nos olhos do Chico (Francisco Porath, que a acompanha desde os 7 anos) e disse: ‘Vou parar’. Sei que isso destruiu ele. É como um pai para mim. Não tinha obrigação nenhuma de cuidar de mim, mas se doou totalmente. Isso tudo não teria acontecido se ele não tivesse me tirado do buraco e me levantado para o céu. Devo isso a ele. E hoje estamos aqui com as medalhas. Ele é um campeão olímpico também.”

Rebeca Andrade (Foto: Jonne Roriz/COB/Divulgação)
Rebeca Andrade (Foto: Jonne Roriz/COB/Divulgação)

Daiane dos Santos e as crianças negras

“A Daiane dos Santos (que conquistou nove medalhas de ouro em campeonatos mundiais) é muito importante na ginástica e como exemplo a seguir. Muitas crianças pretas se inspiram na gente, muitas delas acharam que não seria possível chegar onde a gente chegou e hoje a gente mostra que é possível. Elas precisam acreditar que é difícil mesmo, as oportunidades não são as mesmas, mas as conquistas vão ser melhores, porque tudo que é mais difícil tem um gosto muito melhor. É preciso acreditar em vocês, não desistir de seu sonho.”

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