A Casa de Criadores 57 chegou ao fim nesta quarta-feira (10), com o desfile de cinco marcas autorais e sustentáveis, além das apresentações do concurso da Kenner, lançado em setembro, que teve como inspiração a trajetória de Anitta, embaixadora da marca de chinelos. Os criadores finalistas, de vários Estados do Brasil, mostram sua visão da periferia, de onde vieram.
A beauty artist Maxi Weber, responsável pela beleza do evento, também desfilou para duas grifes. E entre as estreias no evento, Paula Fávero mostrou sua moda urbana e bem feita. Confira resumo do último da da Casa de Criadores.
MOCKUP — Ruptura
A MOCKUP fechou seu ciclo estético para abrir outro: Ruptura chega com a força do romper para renascer. A coleção aposta em recortes precisos, sobreposições arquitetônicas e contrastes entre transparência e volume. O prata domina a paleta, surgindo em superfícies iridescentes, tecidos metalizados e acabamentos luminosos que fazem o corpo refletir movimento.
Com forte compromisso sustentável, a marca transforma descartes da indústria de eventos e calçados — incluindo resíduos da Flyshoes, responsável pelos sapatos — em peças estruturadas que misturam densidade e fluidez.
Míni e maxitops, saias em camadas, parkas recortadas e bases rígidas dialogam com tecidos orgânicos, sempre em um jogo entre o duro e o etéreo. É uma coleção-manifesto sobre iluminar o que antes era contido.
PAULA FÁVARO — O Paradoxo da Vulnerabilidade
Paula Fávaro estreou com emoção à flor da pele. “O Paradoxo da Vulnerabilidade” é uma coleção sobre rachaduras internas — e também sobre libertação. As peças trazem vazados que funcionam como frestas, volumes que parecem prestes a explodir e encontros entre couros e sarjas pesadas com tecidos leves, quase aéreos.
Vestidos com trespasses, casacos estruturados que se abrem como cicatrizes e tops que revelam sobressaias plissadas constroem uma narrativa íntima: a de alguém que finalmente decide existir com coragem. É moda como confissão — e, ao mesmo tempo, como renascimento.
NotEqual — LAB
A NotEqual apresentou LAB, uma coleção que mergulha na transformação entre corpo, matéria e ambiente. Em vez do espetáculo da coleção anterior, inspirada pelo universo circense, a marca volta o olhar para o processo: transparências, recortes cirúrgicos e plissados revelam camadas internas como se o público observasse um experimento em análise.
Organza e gazar de seda criam volumes etéreos, enquanto sarjas dubladas sustentam estruturas mais rígidas. O dupioni de seda (tecido texturizado) surge em tons cítricos e violetas quase neon, fazendo contraste com superfícies acetinadas que lembram líquido sobre a pele. Plissados de arquivo evocam embalagens laboratoriais, e aquarelas pintadas à mão acrescentam temperatura ao visual.
É uma coleção que desnuda o que costuma ficar oculto — um estudo vivo sobre vestibilidade em tempos instáveis.
Sukeban Wear — ENCHANTÉE
A Sukeban Wear voltou de Paris com uma coleção que é puro feitiço. ENCHANTÉE reinterpreta casacos de pele garimpados em brechós franceses, desmontados fio por fio e transformados em novas peças sensuais, misteriosas e luminosas.
São minivests reconstruídos em patchwork, casacos com recorte curvo que parecem dançar no corpo e tops que preservam a maciez da pele original, agora com contorno mais contemporâneo.
A rebeldia brasileira e o charme parisiense se encontram no upcycling artesanal, criando roupas que carregam histórias e renascem como desejo.
Kenner – Projeto “Eu vim de lá”
A marca de calçados Kenner, um dos patrocinadores do evento, mostrou o resultado projeto “Eu vim de lá”, um concurso lançado no Museu de Arte do Rio em setembro deste ano e inspirado na trajetória de Anitta — criada em Honório Gurgel — levou ao palco cinco marcas periféricas de diferentes regiões do Brasil. Cada estilista apresentou sua visão de identidade, memória e pertencimento, sempre conectada às sandálias da marca.
“Cada marca e cada estilista traz uma história singular, com sonhos, desafios, coragem para expandir e resiliência. É justamente isso que evidenciamos desde a criação do ‘Eu vim de lá’, relevando potências que representam a moda em suas diversas expressões. Mostrar o projeto na Casa de Criadores, espaço que reúne tantos talentos, é muito importante para a Kenner”, comentou Lucas Rodrigues, coordenador de branding, estratégia e cultura de marca.
iLoostre (Bahia) — A marca abriu o bloco trazendo ancestralidade e potência retinta. Fez referência à bandeira da Bahia e aos metalizados das joias crioulas, inspiradas nas criações de ourives africanos que chegaram escravizados ao Brasil. Faziam joias grandes para se diferenciar das europeias. Crochês, metais, pingentes e acessórios artesanais deram forma a looks que conversavam com sandálias personalizadas manualmente.
.pormenor (Rio de Janeiro) — Representando o subúrbio carioca, celebrou o Carnaval e as figuras dos bate-bolas e gorilas de saco. Tecidos coloridos, volumes festivos e elementos do futebol apareceram em looks que resgatam a cultura da Zona Norte.
Èssis (Rio de Janeiro) — Buscou no passado da mãe de um dos fundadores a inspiração para reinterpretar crochês e desenhos dos anos 1970. Trouxe jacquard como símbolo de democratização, além de modelagens versáteis e funcionais, reforçando o diálogo com a Kenner.
Ventana (Santa Catarina) — Misturou memórias de infância de Anitta e de sua diretora criativa, usando upcycling com toalhinhas antigas, lençóis e tapetes. A estética de casa afetiva e de tecidos resgatados tomou forma em vestidos, saias amplas e conjuntos de toque manual.
Labô Young (Pará) — Encerrando o desfile, apresentou tramas artesanais e referências à “Galera da Kenner” (GDK), coletivo das aparelhagens paraenses. Cestarias, grafismos amazônicos e texturas naturais celebraram sonhos, cotidiano e identidade nortista.
Desfile de Encerramento – Crie Moda Autoral Transforma
Casa de Criadores 57-
Foto: Marcelo Soubhia/ @agfotosite
A noite terminou com o desfile final da oficina “Crie Moda Autoral Trans Forma”, parceria com Sebrae, Santista, Singer e Veste, em que 30 pessoas trans, travestis e não binárias desenvolveram peças próprias ao longo da semana.
O resultado colocou na passarela uma moda experimental e profundamente autoral — reforçando o espírito da Casa de Criadores: formar, abrir caminhos e multiplicar vozes.