Além da COP30, Amazônia é trend com biomateriais e ações de grifes

A COP30 foi aberta oficialmente nesta segunda-feira (10) e prossegue até dia 21 deste mês, em Belém, no Pará, em plena Floresta Amazônica.  A Conferência das Nações Unidas sobre Mudança do Clima debate justamente o aquecimento climático e deve apontar ações para combater os efeitos no meio ambiente. E sabemos que a indústria da moda impacta negativamente o meio ambiente, já que responde por 8% das emissões globais de gases do efeito estufa , além de ser responsável pelo consumo de bilhões de litros de água todos os anos.

Flavia Aranha no SPFW (Foto: Patrícia Devoraes/Brazil News)
Flavia Aranha no SPFW (Foto: Patrícia Devoraes/Brazil News)

Mas não é só de más notícias que vive o mundo têxtil. Claro, ainda há muito o que evoluir, porém ações efetivas e o uso sustentável de suas riquezas naturais têm sido cada vez mais aplicadas por criadores e estilistas. Os últimos desfiles do SPFW e da Casa de Criadores mostraram que é possível usar a moda a favor do meio ambiente. Um dos exemplos são as várias grifes que aproveitam sobras de materiais ou fazem upcycling de roupas antigas. E ainda há quem esteja à frente de ações para o reflorestamento de regiões.

Confira 5 grifes que levaram a Amazônia às passarelas, indo além das discussões da COP30 e provando que a Amazônia não é só tendência passageira.

Camisetas que “viram” árvores

O estilista Amir Slama, que se inspirou na Amazônia para sua coleção que comemorou seus 35 anos de carreira, não trouxe apenas estampas relativas ao tema. Foi mais além e lançou durante o SPFW o movimento de um movimento de conscientização ambiental intitulado Fashion for Forests. A ideia surgiu depois de viagens pela região amazônica e do encontro que teve com a ativista indígena Txai Suruí e a empresária Catarina Bellino. “Juntos, vimos que podíamos usar a moda como plataforma de comunicação para divulgar esta mensagem fundamental para todos os seres vivos”, disse Amir.

O resultado concreto do Fashion For Forests é a ‘tree’-shirt (nome que vem da palavra t-shirt). Trata-se da camiseta que está sendo comercializada globalmente pela plataforma de vendas online Farfetch, ao preço de R$ 275, cujas vendas permitirão o plantio de árvores no território Paiter Suruí (Rondônia), por meio do programa Pamine Reforestation, que já realizou o plantio de 1 milhão de árvores na região. Cada ‘tree’-shirt resultará em uma árvore plantada. A ideia é lançar diferentes camisetas no decorrer dos anos. A primeira tem design assinado pela artista plástica e modelo Claudia Liz.

Pigmentos com microorganismos amazônicos

A Normando, dos sócios Marco Normando e Emídio Contente, é do Belém do Pará. Na última edição do SPFW, em outubro, mostrou não apenas peças feitas com látex sobre linho e aviamentos de jarina (marfim vegetal) e de fibras como a malva amazônica, mas foi mais além.

Normando (Foto: Ze Takahashi/ @agfotosite)
Normando (Foto: Ze Takahashi/ @agfotosite)

Usou microorganismos amazônicos no tingimento e na estamparia dos tecidos. Pela primeira vez, uma marca nacional utiliza bactérias e algas do Brasil como base para a criação de pigmentos naturais. “Desenvolvido em parceria com o Aiper Lab, startup especializada em soluções biotecnológicas de tingimento sustentável, o processo reduz o impacto ambiental drasticamente, elimina dejetos químicos e cria uma paleta singular de cores, como o tom amarelo-alaranjado”, explicou a marca no material de divulgação.

Desfile da Normando no SPFW (Foto: Lucas Ramos/Brazil News)
Desfile da Normando no SPFW (Foto: Lucas Ramos/Brazil News)

“Ao olhar para a mitologia amazônica, queremos mostrar como, para nós, essas entidades são parte viva do cotidiano, são protetoras da natureza, símbolos de resistência e de identidade. A região é também lugar de inovação, ciência e contemporaneidade. O uso da bactéria como pigmento em lã e viscose abre caminhos para a moda do futuro, enquanto a coleção reforça a força simbólica dos mitos que estruturam o imaginário amazônico. A alfaiataria e a moda em geral sempre foram um território de rigor e tradição. Nesta coleção, quisemos tensionar esse espaço, trazendo a Amazônia como força criativa que renova e expande o conceito de sofisticação”, afirmaram os diretores criativos.

A coleção teve como tema “Mito ou Fauna”, fazendo referências a figuras como a Cobra Grande, o Mapinguari e a Rasga Mortalha, além de releituras da vitória-régia e da cigarra. “Esses símbolos são tratados como parte da vida cotidiana nortista, em uma abordagem que valoriza saberes locais e crenças enraizadas”, explicaram no material de divulgação.

Sementes, pigmentos de bactérias e mais

Flavia Aranha no SPFW (Foto: Patrícia Devoraes/Brazil News)
Flavia Aranha no SPFW (Foto: Patrícia Devoraes/Brazil News)

Outra estilista que usou os pigmentos de bactérias criados pela Aiper foi Flavia Aranha, que desfilou sua coleção no Parque Trianon, criando uma atmosfera de floresta em plena selva de pedra. “Mais do que a poética da floresta, é urgente exercitar uma sociedade em que o petróleo permanece debaixo da terra, e que as soluções venham da floresta viva, de pé. A moda precisa assumir compromissos com mudanças estruturais para conter a crise climática”, afirmou Flavia.

Flavia Aranha no SPFW (Foto: Patrícia Devoraes/Brazil News)
Flavia Aranha no SPFW (Foto: Patrícia Devoraes/Brazil News)

A estilista usou látex amazônico em impressão botânica desenvolvida em parceria com a Da Tribu, além de um produto biotêxtil de algas, criado pelo designer David Cabra, pigmentado com índigo, argila vermelha e verde, e os corantes naturais a partir de bactérias da Aiper. Para o desfile a empresa criou um tom de verde com bactérias amazônicas. “A coleção retoma ainda a pesquisa pioneira da marca com a fibra de malva, utilizada tanto em mechas brutas quanto em fios para a construção de tecidos 100% naturais”, explicou o material de divulgação.

Flavia Aranha no SPFW (Foto: Patrícia Devoraes/Brazil News)
Flavia Aranha no SPFW (Foto: Patrícia Devoraes/Brazil News)

Flavia também trabalhou com artista indígena Xadalu Tupã Jekupé, que fez a pintura manual no panô de alguns looks da coleção, enquanto ceramistas de Cunha desenvolveram colares, anéis e brincos que acompanham as peças. Da Amazônia, vieram também as criações de marchetaria do Acre e as biojoias em macramê com sementes de açaí da Criare, além da parceria com a Canoa Arte Indígena, que traz sementes de tiririca cultivadas por mulheres do povo Krahô, no Tocantins.

Látex, madeira de manejo e sementes

Leandro Castro (Foto: Lucas Ramos/Brazil News)
Leandro Castro (Foto: Lucas Ramos/Brazil News)

O estilista Leandro Castro é conhecido por criar peças a partir de materias de descarte para criar suas coleções. Em seu segundo desfile no SPFW, em outubro, apresentou a coleção Gaiafilia, neologismo que significa amor à terra. “Inspirada na conferência Os Mil Nomes da Gaia e na riqueza da região amazônica, a coleção tem como foco a sustentabilidade, dialogando com a cultura local e a preservação ambiental”, explicou no material de divulgação.

Leandro Castro (Foto: Lucas Ramos/Brazil News)
Leandro Castro (Foto: Lucas Ramos/Brazil News)

As peças nasceram da imersão do estilista no projeto Biomas, iniciativa do Sebrae Nacional sob curadoria de Walter Rodrigues, que o levou para a região de Santarém, no Pará. Durante sua estadia, Leandro Castro mergulhou nos saberes ancestrais de comunidades ribeirinhas, que produzem biomateriais como látex, madeira de manejo florestal, cuias e biojoias. Esses materiais se tornaram a base da coleção, incluídos em bordados em madeira, além de levar o ipê roxo e sementes para as peças.

Chico Mendes

Day Molina e Maria Casadevall (Foto: Andy Santana/Brzzil News)
Day Molina e Maria Casadevall, no desfile da Nalimo (Foto: Andy Santana/Brzzil News)

Na Casa de Criadores, em julho, a Nalimo, da estilista indígena e ativista Dayana Molina, fez uma emocionante homenagem ao ambientalista Chico Mendes, assinado em 1988, a mando de madeireiros, com Maria Casadevall na passarela. Ela passou 10 dias no Acre, junto à família de Chico Mendes, na Reserva Extrativista que leva o nome do ambientalista, para criar a coleção, que trouxe látex da seringueira, cascalhos das castanheiras da Resex (que conserva 1 milhão de hectares da Floresta Amazônica), folhas de vitória-régia, couro de pirarucu, em looks em tons terrosos e brancos.

Desfile da Nalimo (Foto: Andy Santana/Brzzil News)
Desfile da Nalimo (Foto: Andy Santana/Brzzil News)

A coleção “Chico Mendes, no Coração da Floresta”, com suas cores e matérias, mostrou que a Amazônia insiste em existir e resiste. E como disse Day no material de divulgação: “Tudo nesta coleção é corpo de floresta. É modo de existir que recusa a destruição. Esta coleção não desfila. Ela ocupa com beleza. Ela denuncia os corpos que tombam. Ela diz: Chico vive.” E que a moda possa ajudar a Floresta Amazônica a viver sempre.

 

 

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