A modelo Liya Santos, 19 anos, natural de Suzano (SP), é a recordista dos desfiles da edição número 60 do SPFW, que comemora 30 anos de existência. Liya participou de 19 desfiles, mas fez 20 entradas na passarela, desfilando dois looks para Ronaldo Fraga, tornando-se a primeira modelo trans no mundo a atingir esse marco histórico em uma fashion week.

Agenciada por Elian Gallardo Model, Liya abriu os desfiles de Catarina Mina, Foz, Normando e Fauve Brand e fechou os desfiles de À La Garçonne, Sou de Algodão, Cria Costura, Gustavo Silvestre e Weider Silveiro. Liya também integrou o casting de nomes de peso como Lilly Sarti, Marina Bitu, Bold Strap, Alexandre Herchcovitch, Amir Slama, LED, Mercado Livre, Apartamento 03 e Lino Villaventura.

Na indústria da moda, abrir ou fechar um desfile é uma posição de prestígio e visibilidade máxima; um gesto claro de confiança e reconhecimento por parte das marcas. “Eu estou muito, muito feliz. Nem sei se consigo explicar direito, porque até agora parece que estou sonhando, sabe? No meio da correria dos desfiles, eu senti uma certeza tão forte… foi como se tudo fizesse sentido. Alguém me olhou nos olhos, com carinho, e disse: ‘Filha, você conseguiu’. Naquele momento, eu simplesmente congelei. Não sabia se ria, se chorava, se agradecia. Só senti as lágrimas virem e deixei acontecer”, disse ela no material de divulgação.

O fato é ainda mais emblemático ao lembrarmos que o Brasil é o país que mais mata pessoas trans no mundo, pelo 17º ano consecutivo. Só em 2024, houve 105 assassinatos de trans no país, de acordo com o “Dossiê: Registro Nacional de Mortes de Pessoas Trans no Brasil em 2024: da Expectativa de Morte a um Olhar para a Presença Viva de Estudantes Trans na Educação Básica Brasileira”, da Rede Trans Brasil.

“Estar aqui (no SPFW) hoje é muito mais do que uma realização pessoal. É sobre cada menina trans, cada pessoa que foi desacreditada, cada história silenciada. Eu pensei em tudo isso na hora. Pensei em vocês, que estiveram comigo no caminho, acreditando mesmo quando eu duvidava. Isso tem um peso muito grande pra mim. Eu perdi muito, mas ganhei força, ganhei voz. E ver isso se transformar em presença, em passarela, em reconhecimento, é muito bonito”, afirmou a modelo.
E foi mais além: “Não é só sobre mim. É sobre todas as meninas trans que sonham e que, por muito tempo, ouviram que esse lugar não era delas. Eu estou aqui para dizer que é sim. E que com verdade, estratégia e coragem, a gente chega lá”, acrescentou Liya, que também tem passagens por grifes internacionais, como Yves Saint Laurent e Dolce & Gabbana.

Liya agradece quem sempre a guiou na carreira, criando uma base sólida, como Elian Gallardo e na IMG Models, sob liderança de Luiz Matos, agência que também representa nomes como Gisele Bündchen. “Eu sempre achei que um dos maiores presentes que a vida me deu foi cruzar o caminho de pessoas que acreditaram em mim com verdade. Desde o começo, o Elian sempre foi assim comigo. Sem prometer castelos no ar, ele me deu clareza. Me ensinou sobre tempo, imagem e escolhas certas. O Elian esteve comigo quando a dúvida gritou mais alto. Ele me lembrou quem eu sou e por que estou aqui. E Luiz Matos também foi fundamental. Eles me prepararam, me fortaleceram e acreditaram em mim de verdade.”

“Desde o primeiro instante em que vi a Liya diante da minha mesa, ao lado da mãe dela, eu soube que estava diante de algo muito maior do que uma modelo. Eu olhei para as duas e disse: ‘Garota, você será a minha aposta. Mas, para isso, preciso que confie em mim, estude cada detalhe que eu te passar, conheça o mercado de trabalho, as marcas, entenda o que está por trás das criações dos diretores criativos de cada uma delas e, principalmente, o momento que cada uma está vivendo. Porque, além de ser uma modelo, você é uma menina trans — e carrega em si a voz de uma geração inteira de jovens que sonham como você’.”, disse Elian Gallardo ao “Elas no Tapete Vermelho”.

E acrescentou: “Hoje, vê-la quebrando recordes no São Paulo Fashion Week e entrando para a história como a modelo trans com mais desfiles de uma temporada é um símbolo do que a moda brasileira tem de mais transformador. É o reflexo de um olhar que acredita na potência do talento, não na aparência. A Liya representa o futuro — um futuro que começa quando alguém acredita de verdade. E eu acreditei. Eu vi antes. E transformar essa visão em realidade é o que me move há mais de três décadas na moda.”

Elian já descobriu muitos nomes importantes, mas vai além e garante que Liya não é apenas um nome. “Ela é o desenvolvimento de uma marca, um símbolo. Quando eu vi o que ela se tornou, não pensei duas vezes em trazê-la de Paris para realizar o São Paulo Fashion Week. Eu conversei com cada diretor de casting, um por um, falando sobre quem ela é e o que ela representa. E eles entenderam. A Liya não é uma tendência — ela é um marco”, finalizou o agente.

E, sim, Liya é uma marco que vai ficar na história, assim como a modelo negra Amira Pinheiro foi recordista em 2019, e nesta edição fez 15 desfiles. Na ocasião, Amira disse em entrevista ao “Elas no Tapete Vemelho”, que “ter modelos negros na passarela não deveria ser tabu”. Que assim seja também para modelos indígenas (Dandara Queiroz foi recordista em 2022), modelos com corpos diversos (Rita Carreira foi recordista em 2021), e para as tops trans. Liya é mais uma que abre essa porta.